sábado, 16 de julho de 2011

DESINTERESSE, IMPOTÊNCIA E IGNORÂNCIA

“Para falar ao vento bastam palavras. Para falar ao coração são necessárias obras”.
Padre António Vieira (1608-1697)

Só o humano possui a capacidade de inventar tudo acerca do mundo e acerca de si próprio, para se perspectivar como humano e, consequentemente, agir como tal. Efectivamente, numa sociedade em permanente e acelerada mutação, como é aquela em que vivemos, cada vez faz mais sentido mudar, inovar. Temos de mudar é dito por políticos e governantes, educadores e cientistas, jovens e pais, dirigentes e professores, empresários e gestores. Palavras vãs que a realidade tende a confirmar. Na verdade, o desinteresse, a impotência e a ignorância são forças negativas que impedem ou dificultam a abertura à mudança a qual passa, fundamentalmente, pela criatividade. Se é certo que todos nós possuímos talentos criativos, que tal como as aptidões físicas e intelectuais podem ser treinados e desenvolvidos, não deixa de ser também certo que a sua manifestação varia de pessoa para pessoa, dependendo bastante do contexto sócio-cultural em que nasce, cresce e vive.
Mas a realidade é bem diferente. A mudança de hábitos e atitudes não acontece. E, por isso, o POVO PORTUGUÊS se tornou, quer na euforia quer na depressão, um POVO DOENTE. É fácil constatar que cada vez há mais portugueses a refugiarem-se no soporífero (televisão e futebol), no excitável (voyarismo e erotismo), no sobrenatural (seitas e astrologia), na evasão (modas e drogas) recusando-se a pensar, a conhecer e a intervir. Os níveis de crítica volatilizam-se na política, na imprensa, no ensino, nas artes, nos espectáculos, nos convívios e nos sentimentos. Mais: a reflexão intelectual fez-se um desperdício, a competência profissional um supérfluo, a honradez pessoal uma inconveniência, a dignidade cívica uma velharia. Não provocar ondas impôs-se uma divisa. É-se apreciado pelo que se diz, não pelo que se faz. É-se retribuído pelo que se exibe, não pelo que se aprofunda.
E, chegados aqui e agora a este estado de coisas, é minha convicção que isto só se alterará quando, cada um de nós, deixar de ser um mero espectador passivo do teatro levado a cabo por actores, que fazem da política a arte de mentir tão mal, pensando que só poderão ser desmentidos por outros políticos. Excluindo aqueles que aqui e ali vão denunciando e destapando os males da actual sociedade (de que é exemplo alguma, pouca, comunicação social) o facto é que, tirando alguns grupos instalados no regime, nas instituições e nos privilégios ou nos consumos, os restantes, a maioria da população, descobre-se insegura, desamparada, desmente, apática, com medo da vida e do futuro, da realidade e da ousadia.
Tudo isto, no fundamental, tem a ver com a forma desfavorável ou favorável onde o indivíduo é chamado a evoluir. Tem a ver com a educação, com a cultura e os hábitos que respiramos.
Mas nós, portugueses, somos assim. Com futebol aos domingos (e não só), feriados que calhem em dia de semana (se possível com ponte) e telenovelas da vida real, temos o português feliz.
Pobre país o meu que, cada vez mais, se vê afastado do resto da Europa ao constatar o aumento das dificuldades daqueles que são os mais desprotegidos, como os trabalhadores que, dia a dia, vêem os seus empregos ameaçados, senão mesmo até perdidos. Para onde e por onde caminhas, Portugal?
Manuel Alberto Morujo
Abril de 2005

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