A missão suprema do homem
é saber o que precisa para ser homem.
Emmanuel Kant (1724-1804)
A época festiva, que ora decorre, simboliza a celebração do nascimento de Cristo cujo momento mais sublime é no dia vinte e
cinco de Dezembro. Todavia, nem
sempre assim foi. Efectivamente, só
no século IV, por determinação do Papa Júlio I, foi fixado aquele dia para comemorar tão importante e significativo acontecimento histórico.
São três os quadros que caracterizam a época natalícia: o Presépio e a Árvore de Natal, a Missa da Meia - Noite ou Missa do Galo e a Ceia da Consoada ou Ceia de Natal. É, por tradição, a festa da família e também
deveria ser um período de recolhimento, de meditação e, ainda que por breves
instantes, de lembrança daqueles que nunca tiveram Natal e, muito
provavelmente, jamais saberão o que isso é dadas as adversidades da vida.
Mas todo o tempo é tempo, de ser
tempo, para reflectir e, por isso mesmo, permitam-me a franqueza, penso que é
também o período em que a hipocrisia mais se releva. Os exemplos são infinitos
nas famílias, entre colegas e na sociedade em geral, sendo alguns destes chocantes
e dramáticos envolvendo grande parte da humanidade. Senão, vejamos:
Como
é possível haver tanta gente de um
lado a morrer de fome e de sede (cerca de 800 milhões de seres humanos vítimas
de subnutrição) e de outro lado tão grande desperdício?
Como
é consentido tão grande desequilíbrio
entre sociedades desenvolvidas e subdesenvolvidas?
Como
se pode ignorar que, durante a década de
noventa, tenham abandonado as suas casas, devido à guerra, mais de noventa milhões
de pessoas, tenham morrido mais de cinco milhões e ficado feridas mais de seis
milhões?
Como
se pode aceitar que tenham nascido mais
de quarenta milhões de crianças que não foram registadas e que, diariamente,
tenham morrido mais de trinta mil crianças por causas evitáveis e, PASME-SE, existam mais de cem milhões
de crianças que vivem ou trabalham na rua?
Como
não se evitou que mais de dezoito
milhões de seres humanos tivessem morrido devido a doenças transmissíveis?
Efectivamente, não serão estes motivos
suficientes, mais reais do que aparentes, para nos sentirmos envergonhados e
perturbados?
Esta realidade não pode, nem deve, ser
escamoteada pois é por demais evidente que escolhe como alvos os mais
desprotegidos, mas que poderá também chegar a toda a sociedade universal se,
hipocritamente, continuarmos a ignorar o Mundo que nos rodeia. Tolerar situações destas, num mundo dito de global, somente pode acontecer devido à exploração do homem pelo homem, do oportunismo, da inveja, do desemprego, da droga, da
insegurança e da corrupção. Tudo isto
poderia não existir se houvesse o
hábito, a vontade do que deve ser um
ideal e o meio de o realizar, de pôr
esta regra em prática para todos os homens
de todos os lugares, por imperativo
categórico, tendo em conta o que é necessário fazer e o que é preciso evitar com um espírito de fraternidade. E, não acontecendo assim, A ÉPOCA NATALÍCIA, O NATAL, onde
quer que seja celebrado,
terá sempre uma chaga, ainda
que muitos não dêem por ela,
reflexo daqueles que são vítimas da natureza humana.
Manuel
Morujo
(Escrito e publicado em 5
de Dezembro de 2003)
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