sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

DESABAFO


Não me levais a mal que, nesta época em que a hipocrisia mais anda por aí, emita um desabafo. Só com ele ficarei aliviado, sem aperto no coração ou fantasmas na consciência.
Cito Miguel Torga:
“Aqui, neste país e nesta hora.
Aqui, junto dos meus,
Mortos e vivos,
Aqui, de pés atados,
Livre como os balões cativos,
Que pairam, ancorados.”
A nossa história pessoal é um somatório de pequenas e grandes decisões. Embora o elogio seja pouco frequente, todos gostamos de ver reconhecido e apreciado o nosso esforço. Se na verdade aqui ou ali esse elogio surgiu, verdade é que, retirado ou forçado à retirada, surge o cair da parra. Estou farto de me vestir todos os dias, de cumprimentar todos os dias, de dizer todos os dias sim. A vida é cruel, excede muitas vezes o imaginável. Quando dei pelo que ela tem de reles e de grotesca, veio-me a tristeza.
É sabido que grande parte do nosso quotidiano é comandada pela força dos hábitos. É graças a eles que executamos, sem grande dispêndio de tempo e energias, um ilimitado número de actos. Muitos hábitos começam por ser frágeis teias de aranha que, pouco a pouco, se transformam em fortes cordas de aço que aprisionam a espontaneidade e criatividade.
“Viver não é necessário. Necessário é criar” escreveu Fernando Pessoa.
E eu considero-me criativo, mas passei o período de validade. Interesso-me pelos pontos de vista e problemas dos outros e interrogo-me, habitualmente, porque se hão-de fazer as coisas de determinada maneira e não doutra, ou simplesmente porque se fazem?
Teixeira de Pascoaes disse em verso:
“Tenho, às vezes, saudades do futuro
Como se ele já fora decorrido.”
É que o futuro, que desejo, aparece-me como uma espécie de já vivido ou, talvez melhor, como qualquer coisa que pressinto e que acho que me foi prometida.
Devo reconhecer aqui e agora que, nos últimos anos, as coisas não funcionaram. Foram as circunstâncias. De entre todas, destaco o empenho pessoal para dar vida e sustentabilidade ao Movimento de Cidadãos do Norte Alentejano, em 2006, e assim poder ser útil com a força do trabalho e dos conhecimentos adquiridos ao longo da vida pessoal e profissional. Da grande maioria contactada, recebi um silêncio ensurdecedor. Nem um abanar da folha, nem um silvo. Foi então que senti que, muitos conhecimentos, não são sinónimo de amizade.
Talvez tenha errado nas apostas políticas e naquilo que me expus ao emitir opinião, publicamente. Mas não estou arrependido do percurso que fiz, o qual reconheço, não me deu frutos. Pelo contrário, prejudicou-me.
Termino, não com votos do que não sinto, mas com os desejos de que “a noite de breu” seja mais breve  do que se adivinha.
E citando Leão Tolstoi:
“É pena a gente abandonar tudo aquilo com que vivi e estava habituado! Mas, que se há-de fazer? É preciso, também, a gente habituar-se ao que é diferente

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